Coluna: estamos vivendo em uma bolha de unicórnios?
Quando um ativo é precificado apenas por um investidor, dificilmente conseguimos ter uma boa sensibilidade do mercado, pois naturalmente existe um viés
Recentemente presenciamos a ascensão e queda da percepção pública em relação à WeWork, a gigante dos coworkings. Ao submeter os documentos da sua oferta de abertura de capital, o mercado se deparou com discrepâncias entre a percepção de valor e o valor real, mostrado pelos números da companhia. Em pouco tempo, a empresa tirou a oferta da mesa e demitiu seu CEO, tendo que ser salva pelo seu maior investidor, o Softbank.
Este relato não é único, e a recente onda de IPOs no mercado norte-americano se provou bastante desafiadora no que diz respeito ao potencial de lucro de uma série de empresas. A questão que podemos nos fazer é: estamos vivendo em uma bolha?
Bolha financeira
Antes de responder esta pergunta, é interessante definirmos uma bolha financeira. Trata-se de uma rápida escalada no preço de ativos financeiros, seguidos de uma queda brusca. Basicamente, os investidores apostam em uma determinada classe e depois desistem bruscamente, uma vez que o valor destes ativos não se comprova.
Analisando o que aconteceu nos últimos anos, no mundo, especialmente no Vale do Silício, presenciamos o surgimento dos unicórnios, empresas privadas com valor de mercado acima de U$ 1 bilhão. Este nome foi dado devido a raridade deste tipo de empresa. Com a abundância de capital disponível, os fundos de venture capital (fundos que investem em startups) aumentaram consideravelmente de tamanho.
O maior expoente deste movimento foi o Softbank, que montou o Vision Fund, fundo de U$ 100 bilhões, o maior veículo de investimento neste tipo de ativo até então. Para termos uma ideia de comparação, os maiores fundos até então raramente chegavam a 1% deste valor.
Precificação de unicórnios
A evolução das diversas tecnologias, que hoje estão presentes em nossas vidas, e o crescimento da inovação na China também aceleraram muito este movimento. Quando um ativo é precificado apenas por um investidor, dificilmente conseguimos ter uma boa sensibilidade do mercado, pois naturalmente existe um viés. E foi justamente isso que aconteceu com várias das empresas avaliadas como unicórnios.
Um fundo investe U$ 10 milhões e fica com 10% da empresa, valorizando-a em U$ 100 milhões. Na sequência, vem um mega-fundo e investe mais U$ 150 milhões e fica com 15% do negócio. Pronto, temos unicórnios.
Como entender se este ativo está valorizado acima do mercado? É claro que podemos fazer diversas aproximações de valuation, tendo em vista o crescimento, tamanho do mercado e capacidade provável de captura de valor futuro deste negócio. Mas ainda é uma promessa. A medida que estes negócios vão crescendo, estes investidores precisam de liquidez. E onde se consegue liquidez em um investimento deste tamanho? No mercado de capitais. A opção é fazer uma oferta pública de ações.
IPO
Ao abrir o capital, os dados da companhia se tornam públicos e milhares de investidores podem ter acesso a estas informações e tomar suas próprias decisões a respeito do valor deste negócio.
A Tesla se tornou maior do que a GM e a Ford somadas no início deste ano. E este valor só se comprovará se várias teses acontecerem. Mas é assim que funciona o mercado. Alguns apostam no crescimento e outros não. O problema é quando a empresa não tem perspectivas de retorno futuro, como aconteceu com a WeWork antes do possível IPO e está acontecendo com o Uber atualmente.
Neste caso, o mercado corrige o valor a partir de expectativas mais realistas dos investidores.
Voltando a questão inicial em relação a bolha, eu acredito que diversos ativos estejam com valor exagerado neste momento. Mas não acredito na generalização, uma vez que existem diversas empresas que estão indo bem e com valuations bastante condizentes com sua performance no mercado.
Isso sem mencionar que a geração anterior de empresas digitais são verdadeiras máquinas de imprimir dinheiro. Facebook e Google são extremamente lucrativas. Assim como Apple e Amazon (mesmo esta tentando não ser).
Independentemente do dinheiro ficar mais escasso nos próximos anos, acredito que várias das startups que temos no Brasil e no mundo são sólidas e estão transformando os mercados onde atuam e gerando resultados relevantes. Os exemplos devem aumentar cada vez mais.
Ao mesmo tempo, as empresas que não se provam relevantes sofrerão ajustes em seus valuations, que impactarão as startups que não fizeram IPO ainda, mas têm semelhanças nos modelos de negócio, ajustando o restante da cadeia.
Como eu e meu co-fundador costumamos dizer: faturamento e lucro, nunca saem de moda.
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