Coluna: Qual é o segredo para formar times inovadores?
Times inovadores, antes de tudo, reconhecem as possibilidades de falhas e a interdependência entre times na busca por soluções efetivas
Na minha última coluna trouxe a provocação sobre a crescente vulgarização do termo inovação — especialmente em momentos de total incerteza — e como isso pode representar um fracasso para todos nós, entusiastas do tema e profissionais da área. Nesse mês, nada mais justo do que trazer informação sobre o principal fator de sucesso de empresas inovadoras que sustentam um ambiente no longo prazo — com ou sem crise.
Desde as colinas da Grécia antiga até as janelas virtuais do trabalho remoto na pós-modernidade, o lema de Aristóteles “o todo é maior que a simples soma de suas partes” é uma afirmação ponderosa. Tanto filosófica quanto financeiramente, é difícil refutar o pensamento aristotélico, especialmente dependendo do objeto de análise — nesse caso, a dinâmica necessária para nutrir inovação sustentada.
Sabemos ser mais custoso contratar e formar novas equipes do que reter talentos existentes. Além disso, diferentes estudos comprovaram que a diversidade de pensamentos e perfis é benéfica para a inovação. E defender o pensamento holístico virou ´mainstream´.
Necessidade da segurança psicológica
Por que, então, continua sendo tão desafiador inovar?
Trata-se de uma batalha entre visões filosóficas difícil de equilibrar até mesmo para monges, quem dirá para executivos. Ocorre que, quanto maior a pressão e a imprevisibilidade ao nosso redor, maior a armadilha do reducionismo e do pensamento cartesiano.
Não à toa, uma das empresas mais valiosas e inovadoras do mundo, o Google, realizou um extenso estudo acompanhando 180 times internos, durante quatro anos, para identificar quais fatores diferenciavam os excelentes daqueles cuja performance não era tão surpreendente.
O Projeto Aristóteles, nome dado ao estudo em homenagem ao filósofo grego, identificou cinco fatores, sendo o primeiro deles o de maior e unânime relevância: segurança psicológica.
O termo se resume a “crença compartilhada pelos membros de uma equipe de que esta está segura para a tomada de riscos interpessoais” e foi cunhado pela pesquisadora e professora de Harvard, Amy Edmondson, ao estudar a interação de times sob grande stress, como profissionais de saúde na ala de emergência de um hospital, e o time de especialistas que colaboraram para o salvamento dos mineiros soterrados na mina de San Jose, no Chile, em 2010.
Em outras palavras, segurança psicológica é um senso de que a equipe — e sua liderança — não irá rejeitar ou punir alguém por se pronunciar. Ou seja, o silêncio de uma equipe em determinada situação pode falar muito mais alto sobre o estado do time e as opiniões — possivelmente — não expressadas.
Desafios da inovação
Voltemos, então, ao aspecto da vulgarização do termo inovação e seus riscos práticos a partir da seguinte situação hipotética:
A pandemia impôs grandes perdas financeiras para a empresa “X” e os executivos estão pressionados a buscar novas fontes de receita. A solução mais rápida é escalar o produto “Y” em busca de novos mercados. O time responsável pelo projeto ainda não concluiu a prototipação e validação, pois o cronograma foi afetado pela quarentena, mas já identificou necessidades de melhoria em determinadas configurações do produto “Y” e oportunidades de uma nova versão “Y+” para atender outro segmento de público. Durante a reunião semanal, o direcionamento da liderança é comunicado: “Não podemos mais esperar, precisamos inovar e gerar receita. Vamos escalar o produto “Y”. Já que a validação atrasou, peço ao time responsável que acelere a implementação imediatamente. Num grande silêncio todos “concordaram”.”
Na história acima, é impossível saber se escalar o produto “Y” trará os resultados esperados ou não. Também, é impossível avaliar a dimensão dos desafios internos e consequente impacto no julgamento dos executivos. Porém, algo é certo: se existisse segurança psicológica nesse time, diferentes alternativas seriam discutidas, como, por exemplo, lançar os produtos “Y” e “Y+”. O risco provavelmente seria minimizado e a equipe se sentiria responsável pela solução e mais envolvida na execução decidida.
Moral da história: um projeto com potencial para gerar inovação relevante pode ter sido perdido pela gestão ineficiente do processo, do aprendizado envolvido e, especialmente, do time. Como já vimos, quanto maior a pressão e a imprevisibilidade ao nosso redor, maior a armadilha do reducionismo.
Reconhecer as incertezas
Compreender o conceito de segurança psicológica na teoria é fácil, mas entendo a complexidade de mantê-lo como parte integrante da agenda de liderança.
Mesmo para profissionais altamente qualificados, como é o caso dos Googlers, supostamente com elevada autoconfiança e ao mesmo tempo que se sentem responsáveis por seus projetos e entregas, é determinante.
“Por isso, o melhor caminho para formar times inovadores é, antes de tudo, reconhecer a enorme incerteza, a possibilidade de falhas e a interdependência entre times na busca por soluções efetivas.”
A partir daí, compartilhar e enquadrar o desafio como um problema de aprendizagem conjunto, e não como um mero problema de execução. Afinal, o segredo de times ágeis é saber dialogar, tanto com Aristóteles quanto com Descartes.
CLIQUE PARA MAIS ARTIGOS